4.7.02

Pulp Hack II
em 01.07.02

O escritor pensava, enquanto tentava se levantar, em como era difícil conciliar seus desejos e gêneros literários. Queria ser pulp, não tinha dúvidas disso, mas faltava a inspiração adequada. Claro, tinha a cidade sórdida e corrupta à vista sob sua varanda, mas não se sentia tocado pela sordidez. E não era só pela altura do apartamento ou dos muros que o cercavam. Podia ver a cidade nua, mas como um voyer, Nunca com um participante. Claro que foi isso que o tornou um escritor, em primeiro lugar.

"Não é assim que deve ser", concluía, enquanto cuspia os restos na boca nos menos afortunados na calçada. Sua relação com as distâncias eram complicadas. Tentava colocar espaços entre ele e tudo aquilo que escrevia, ao mesmo tempo que se esforçava para abraçar os simulacros absurdos que construía ao seu redor. Afinal, sua cidade não era nem Los Angeles nem Nova York. Não tinha nem de longe o estilo necessário: ninguém nesse buraco tomava martinis ou bourbons. E noir com cachaça não dá.

Mas seu maior problema era de outra natureza.

Queria ser pulp, queria ser barato, mas mesmo com a cabeça martelando na ressaca e os dedos doloridos da máquina de escrever, não conseguia se sentir assim. Perdido sua reencenação de Pierre Mainard, não conseguia entender as razões enquanto vasculhava suas estantes. Tudo que deveria ler estava lá, devidamente lido. Todos os escritores que sobreviveram, todos os escritores que eles leram. Até os livros com cada fotograma de Casablanca e O Falcão Maltês. Mas faltava alguma coisa que não conseguia determinar.

Foi ao acender o primeiro cigarro, sentando em frente à máquina, que percebeu a fotografia sobre a mesa.