23.5.04

21 Dias: Anotações Para uma Crítica de Simulações - Projeto São Paulo (trechos)

em 23.04.04

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É claro que toda essa complexidade não poderia ser transformada em uma simulação sem que alguns elementos fossem simplificados ou mesmo eliminados. Nem os mais poderosos sistemas seriam capazes de construir algo como o Projeto São Paulo sem que atalhos fossem criados. O grande volume de informações tornaria a coleta de dados necessária à construção de um modelo de simulação um exercício fractal, onde os dados crescem de forma exponencial: cada novo objeto implica em novos aspectos e novas relações infinitas para todos os propósitos. Atalhos e representações propriamente ditas - em oposição a simulações strictu sensu - são obrigatórias, portanto.

A questão é em que níveis e em que intensidade se dá tal economia na representação?

O segredo da simulação no Projeto São Paulo é a sua escala. Em lugar de tentar uma simulação que dê conta de todas as relações possíveis entre os usuários e o sistema, a solução encontrada foi a criação de narrativas limitantes. Uma vez inseridos em uma das esferas de atividade, os jogadores limitam as possibilidades de modo natural - ou seja, de sua própria volição, em lugar de cenários nos quais o computador se vê obrigado a informar ao jogador que nada existe ali. As deficiências técnicas são, portanto, contornadas narrativamente. O foco do desenvolvimento do projeto passa da transcrição de elementos do real para a criação de situações que enquadrem de modo eficiente os desejos dos jogadores, tornando as escolhas limitadas previstas na simulação as mais interessantes no aspectos teleológicos.

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Elementos gráficos também são simplificados. A paisagem urbana permite que grupos de prédios recursivos - topoi - sejam utilizados, sem que os jogadores entrem em contato ou percebam as semelhanças. A poluição que borra desproporcionalmente os objetos no horizonte e reduz a visibilidade do céu contribuem para a economia de capacidade de processamento tanto ao reduzir o número e definição dos objetos representados quanto ao contribuir com elementos narrativos que reduzam o desejo de interação com personagens-cenário. Oras, todos fomos convencidos por anos de clichês - ou, antes, precisamos fazer um esforço para reconhecermos a falsidade da afirmação -que a poluição está diretamente ligada à violência urbana. Filmes de ficção científica como Predador e Blade Runner usam a poluição na construção de cenários impiedoso e perigoso, onde interações desnecessárias não rendem resultados agradáveis. Ao remeter o clichê, diminuem-se o número de interações desejáveis.

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