23.2.02

Digressões Sem Nicotina
Em 22.04.99

Mais uma vez, passei meu dia em casa.

Mais um dia pulando aulas, pensando sobre o tempo, lendo, brincando com imagens... Imagino a imagem de uma câmera além do teto do meu quarto me filmando: eu deitado na cama, de camisa regata, fumando. (Não que eu fume, use camisa regata ou mesmo tenha certeza de que o quarto e corpo na imagem são meus).

Me peguei, durante a tarde, ouvindo discos que não ouvia há algum tempo. E outros que ouço quase demais: o primeiro Garbage, Protection, Lost Highway, os três Cowboy Junkies e até um Suzanne Vega (e não o melhor deles).

Foi ouvindo “Light my Fire”, numa versão do Massive Attack que um pensamento que começou a se formar ontem se calcificou: as músicas que eu amo nos discos raramente são as por quais me apaixono à primeira vista (à perpétua exceção de “The Perfect Drug”).
Troquei “Only Happy When it Rains” por “Fix me Now”. “Teardrop” por “Inertia Creeps”, “Head Like a Hole” por “Down in It”. E, apesar de muitas vezes me esquecer de ouvir “Common Disaster”, paro tudo para ouvir “Bea’s Song” (btw, com licença).

(retornando...)

Esse tipo de bobagem me fez, sei lá por que razões, refletir sobre que coisas vão se tornando permanentes em nossas vidas (mais especificamente, em minha vida). As coisas mais improváveis. E raramente aquelas que esperamos.

Eu esperava ainda acreditar piamente na Ciência, ainda ser amigo de determinadas pessoas, ainda usar cabelo comprido (idéia que hoje coça)...

E esperava já ter me despedido do tesouro sob minha cama, ter esquecido quem é Neil Gaiman, não mais ver Salvador À Noite. E definitivamente, não esperava ver as fuças de alguns de vocês depois de quase (ou mais) de dez anos.

E o que espero hoje? Fingir que sou outra pessoa em alguns sábados por mais dois ou três anos, esperar ansiosamente cada encomenda de quadrinhos por mais umas duas décadas, me formar algum dia...

Não ouso imaginar muito além disso. Não consigo me imaginar sem óculos ou empregado corretamente. Não consigo imaginar meu rosto ou roupas em três anos. Não consigo imaginar nenhum panorama plausível para mim, nem identificar minha cena obrigatória.
Fico pensando em qualquer mundo viver. Eu, imóvel em mim, em vários mundos.

Por que diabos é mais fácil imaginar mundos que nós mesmos?

Às vezes acho que deveria fumar. Mentolados são melhores que pensamentos.