Diálogo Recursivo V: Impasses
em 17.02.03
- "Quero estar só com você". Foi isso que você disse, não foi?
- Foi. Mas tem muito tempo. Hoje as coisas são mais complexas que isso.
- Só que você nunca se desdisse. Eu pensava que ainda era assim.
- Ainda é.
- E por que você está com ela?
- Eu não estou. Estou com você. Ele foi só um acidente.
- Acidente... Não é você que não acredita em acidentes?
- ...
- E por que a mentira?
- Não é isso que você quer saber, é?
- É. Não. Você sabe o que eu quero saber.
- É só perguntar.
- Eu já perguntei. Você é que não respondeu. Por que você está com ela.
- Eu respondi. Eu não estou com ela, estou com você.
- Mas não está só comigo. Não mais.
- E não é isso que você sempre quis? Não é o que você me empurrava para fazer desde que nós começamos? Cada vez que conversamos, cada vez que acordamos juntos. A cada sábado que você tinha mais o que fazer e meus convites eram incômodos.
- Eu nunca quis que você tivesse outras pessoas. Só não queria me prender a ninguém.
- Você sempre quis que eu tivesse outras pessoas. Mas para mitigar suas culpas, para livrar suas noites, quando fosse conveniente. Só que agora é conveniente para mim.
- Nós devíamos terminar tudo agora.
- Deixe de ser idiota. Isso não vai resolver nada.
- O que me apaixonou em você foi sua segurança. A certeza de que você agüentaria tudo que eu fizesse, que sempre me perdoraria. Que me amaria apesar de tudo.
- Se foi isso, você passou seu tempo comigo enganada. Eu sempre disse que minha paciência tinha limite.
- Você ainda quer estar comigo?
- Eu ainda quero estar só com você.
- Então desista dela.
- Se você estiver disposta a parar de fugir de mim. Eu amo você, mas estou cansado das escolhas. Você é quem decide como as coisas vão ser.
- E se eu não quiser?
- Então tudo já está resolvido.
17.2.03
9.2.03
Sonho II
em 09.02.03
O azul do mar - exatamente seu tom favorito - não é nada natural. E a água não costumava ir até ali, até a calçada, ou ser tão parada. Sentado ali, na beira da piscina que ultrapassa o horizonte, você percebe que há algo errado. Como se o mundo tivesse mudado de repente enquanto você não prestava atenção. Mesmo assim, o sol se pondo causa uma certa paz.
Um bebê ou uma criança se aproxima, falando algo que você não consegue entender, mas é muito importante. Se ela parasse de desaparecer quando você se concentra nela, seria muito mais fácil entender. Ela fita seus olhos com uma piedade que destrói você e pula na água. A criança afunda devagar até o fundo e é possível vê-la durante todo o percurso, apesar das águas escuras. Você percebe que a criança precisa de ajuda e mergulha atrás dela.
No fundo, há restos bem conservados de uma cidade vagamente grega, mas cheia das imagens da vida moderna. Se não fosse o peso diferente e uns cardumes aqui e ali, você nunca perceberia que está sob a água. Procurando pela criança, você encontra um amor antigo, chorando tranqüila - lágrimas distintas da água. Você se aproxima, limpa uma lágrima e pergunta se está tudo bem. Ela responde e você se beijam.
Você percebe que precisa respirar e a convida para ir com você. Ela diz que não pode, mas você deve ir assim mesmo. "Nos vemos depois", você ouve enquanto flutua numa velocidade absurda. O impulso é suficiente para jogá-lo metros acima da água, como os saltos dos golfinhos. Enquanto enche os pulmões, você enxerga o bebê, voando ao longe. Enquanto desce, você procura pela mulher que deixou no fundo. A água vai ficando cada vez mais escura, os pulmões vão ardendo e você não consegue encontrá-la.
em 09.02.03
O azul do mar - exatamente seu tom favorito - não é nada natural. E a água não costumava ir até ali, até a calçada, ou ser tão parada. Sentado ali, na beira da piscina que ultrapassa o horizonte, você percebe que há algo errado. Como se o mundo tivesse mudado de repente enquanto você não prestava atenção. Mesmo assim, o sol se pondo causa uma certa paz.
Um bebê ou uma criança se aproxima, falando algo que você não consegue entender, mas é muito importante. Se ela parasse de desaparecer quando você se concentra nela, seria muito mais fácil entender. Ela fita seus olhos com uma piedade que destrói você e pula na água. A criança afunda devagar até o fundo e é possível vê-la durante todo o percurso, apesar das águas escuras. Você percebe que a criança precisa de ajuda e mergulha atrás dela.
No fundo, há restos bem conservados de uma cidade vagamente grega, mas cheia das imagens da vida moderna. Se não fosse o peso diferente e uns cardumes aqui e ali, você nunca perceberia que está sob a água. Procurando pela criança, você encontra um amor antigo, chorando tranqüila - lágrimas distintas da água. Você se aproxima, limpa uma lágrima e pergunta se está tudo bem. Ela responde e você se beijam.
Você percebe que precisa respirar e a convida para ir com você. Ela diz que não pode, mas você deve ir assim mesmo. "Nos vemos depois", você ouve enquanto flutua numa velocidade absurda. O impulso é suficiente para jogá-lo metros acima da água, como os saltos dos golfinhos. Enquanto enche os pulmões, você enxerga o bebê, voando ao longe. Enquanto desce, você procura pela mulher que deixou no fundo. A água vai ficando cada vez mais escura, os pulmões vão ardendo e você não consegue encontrá-la.
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